Offline

UEM em rede: pesquisa prevê impactos da mudança do clima na biodiversidade
Notícias de Maringá
Publicado em 30/06/2024

Como as mudanças climáticas podem afetar a distribuição geográfica da araucária, árvore símbolo do Paraná? Novas pragas e doenças podem surgir no estado com o aumento das temperaturas? Ou seriam as abelhas, importantes polinizadoras para diferentes cultivos, as mais afetadas pelo aquecimento global nas próximas décadas?

É o que pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá (UEM) querem descobrir. Um projeto realizado em conjunto com outras Instituições de Ensino Superior (IES) do estado trabalha no desenvolvimento de um software que busca prever o impacto das mudanças climáticas na biodiversidade paranaense, com ajuda de Inteligência Artificial (IA).

A iniciativa é vinculada ao Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação em Emergência Climática (Napi-EC), rede de pesquisa financiada pela Fundação Araucária (FA). Pela UEM, participam professores e estudantes do Programa de Pós-Graduação em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais (PEA), com apoio do Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aquicultura (Nupélia)

Iniciados há menos de um ano, os trabalhos em rede viabilizaram a criação do software CaretSDM, atualmente em fase de testes de sua versão piloto. Programado em linguagem “R”, o sistema combina, em modelos computacionais, informações sobre as condições ambientais em que as espécies vivem e previsões climáticas para as próximas décadas, em diferentes cenários de emissão de carbono.

Assim, o programa pode revelar como elementos importantes da biodiversidade paranaense reagirão às mudanças do clima. “Nós sabemos que a distribuição das espécies, condicionada pelos fatores climáticos, deve se alterar no futuro. Por exemplo, uma espécie que ocorre amplamente no Paraná pode passar a não ocorrer mais no futuro, em virtude da mudança drástica dos parâmetros climáticos. E isso traz uma série de complicadores, porque todas as espécies da natureza prestam serviços aos humanos, mesmo que indiretamente", apontou a professora do Departamento de Biologia (DBI) Dayani Bailly, coordenadora institucional do Napi-EC na UEM.

Árvore representativa para a identidade cultural paranaense, a araucária foi escolhida para os primeiros testes do programa. Análises iniciais mostram que a área de distribuição da espécie pode diminuir consideravelmente no estado até 2050 e 2090, conforme diferentes cenários de aumento da temperatura.

Os testes iniciais do CaretSDM também analisaram a distribuição geográfica de aves encontradas em território paranaense. Futuramente, conforme os pesquisadores, os trabalhos podem envolver outras populações animais e vegetais de impacto socioeconômico - são exemplos insetos polinizadores, como as abelhas, e peixes de importância comercial, bem como espécies relacionadas a eles. Também é possível utilizar o software para prever o avanço de pragas e o surgimento de vetores de novas doenças no estado.

Além disso, o início de uma vertente experimental do projeto está previsto para o segundo semestre de 2024. Testes em laboratório avaliarão a resposta fisiológica e ecológica das espécies animais e vegetais, como a araucária, em diferentes simulações climáticas.

 

Trabalho em rede

A integração criada pelo Napi-EC promove parcerias e redes de trabalho entre as instituições de pesquisa. O segundo eixo estruturador do Napi-EC, que estuda a emergência climática pelo prisma da biodiversidade, reúne pesquisadores da UEM, da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e do Câmpus Campo Mourão da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

Entre os participantes, há estudiosos das áreas de Biologia, Ecologia e Ciência da Computação, que convergem ações para as áreas de transformação digital e desenvolvimento sustentável - ambas condicionantes horizontais estabelecidas pela FA.

Conforme Bailly, a parceria entre UEM, UEL e UTFPR potencializa os resultados do projeto. “Essa estrutura de financiamento em rede faz pessoas de diferentes áreas conversarem. Os pesquisadores pensam e tomam as decisões juntos. Nossos alunos de pós-graduação estão em constante contato com os alunos das outras instituições, e o contrário é verdadeiro. Quando você tem um estudo, de fato, integrado e interdisciplinar, os alcances são muito maiores”, comemorou.

Além da coordenadora institucional, representam a UEM no Napi-EC os professores Roger Paulo Mormul e Sidinei Magela Thomaz, ambos do PEA. Também participam seis pós-graduandos do PEA, bem como o bolsista e pós-doutorando pela UEM Luiz Fernando Esser.

 

Inteligência Artificial

Para “prever o futuro”, o CaretSDM é alimentado com informações fornecidas pelos pesquisadores. São necessários, por exemplo, dados de ocorrência das espécies e previsões climáticas para as próximas décadas.

Os primeiros, que correspondem a latitude, longitude e características ambientais das áreas habitadas pela espécie analisada, são obtidos em bases de dados internacionais e em bancos de registros das próprias IES, como o extenso acervo do Nupélia. Já as variáveis climáticas utilizadas pelos pesquisadores têm a chancela do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), principal autoridade mundial no assunto.

Além disso, o software tem, como aliada, a Inteligência Artificial (IA). A versão atual do CaretSDM oferta, ao usuário, mais de 230 algoritmos distintos de aprendizado de máquina - ferramentas de IA que permitem ao sistema uma evolução contínua dos resultados apresentados. Como comparação, segundo os coordenadores do projeto, outros programas existentes no mercado para o mesmo fim reúnem cerca de 20 algoritmos plenamente operantes.

“Estamos reunindo uma gama de algoritmos que grandes empresas utilizam, até mesmo algoritmos que são usados para a detecção de câncer, por exemplo, e trazendo para a predição de espécies. Isso é um avanço absurdo em termos analíticos, porque em nosso conhecimento, não existe, até o momento, uma plataforma computacional que reúna tamanha combinação de algoritmos para predição da área de distribuição de espécies”, destacou Bailly.

O objetivo final do projeto é disponibilizar o software ao governo do Paraná, como forma de auxílio à formulação de políticas públicas de combate à emergência climática. O sistema, no entanto, também poderá ser utilizado para o monitoramento de espécies em variadas regiões do Brasil e do mundo.

 

Novos Arranjos de Pesquisa e Inovação

O Napi-EC configura uma rede estadual de pesquisa e inovação no âmbito da emergência climática. A demanda principal é buscar soluções para que o Paraná cumpra o compromisso assumido com o Protocolo de Paris e a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) Brasileira, em um trabalho transversal entre diferentes instituições de pesquisa do estado. Órgão financiador da iniciativa, a FA já aprovou investimentos na ordem dos R$ 3 milhões para as bolsas e custeio das pesquisas.

Ao lado de UEM, UEL e UTFPR, integram os diferentes eixos estruturadores do Napi-EC as universidades estaduais do Paraná (Unespar), do Oeste do Paraná (Unioeste), do Centro Oeste (Unicentro) e de Ponta Grossa (UEPG), além da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Instituto Federal do Paraná (IFPR). Há, ainda, a participação de instituições privadas e entidades de pesquisa, como a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), o Sistema Meteorológico do Paraná (Simepar), o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR) e o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (Ceped-PR).

Ao todo, a FA atua no fomento a cerca de 40 Napis, criados para atender demandas setoriais, regionais e estaduais de forma integrada e racionalizada. Há redes de pesquisa em temas variados, como nanotecnologia, hidrocarbonetos, educação para a ciência e segurança pública, entre outros. Mais informações sobre os Napis estão disponíveis no portal iAraucária.

(Vinicius Guerra/UEM)

Comentários
Comentário enviado com sucesso!