Na tarde de 24 de abril de 2019, André Brasil publicou a seguinte mensagem nas redes sociais. "Indignação, revolta, tristeza. Uma história apagada em um dia". Horas antes, o nadador campeão paralímpico foi considerado inelegível para eventos de atletas com deficiência nas provas em que é especialista. Exatamente um ano depois, e com o recurso negado no Comitê Paralímpico Internacional (IPC, sigla em inglês), ele ainda aguarda resposta da Justiça alemã, à qual recorreu - com apoio do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) - para poder voltar a competir.
Por um lado, André está mais conformado com a perspectiva de não disputar a Paralimpíada de Tóquio (Japão), mesmo após o adiamento para 2021 devido à pandemia do novo coronavírus (covid-19), o que poderia lhe dar mais tempo para treinar, se fosse liberado. Por outro, espera uma posição definitiva para “sair do limbo” e “continuar a sonhar”, como relatou o nadador, de 35 anos, em entrevista à Agência Brasil.
"Sonhar a gente sonha muito, mas eu já não sei se tenho essa vontade, esse querer de estar nos Jogos e não poder, de repente, fazer o que sempre fiz a vida inteira. Meu corpo não é mais o mesmo, a cabeça não é mais a mesma. Não sei se, com tudo que vivenciei, se teria tempo hábil. O corpo não responde tão rápido como quando se tem 20 anos. Ganhar massa ou emagrecer fica mais difícil", reflete André.
Além de ter retomado as atividades físicas só em setembro "para manter a qualidade de vida”, o atleta não compete desde 2018, quando precisou se submeter a uma cirurgia no ombro esquerdo.
"Provavelmente, é a sentença de um juiz que vai determinar algo. Não foi para isso que entrei no esporte, que sonhei conquistar alguma coisa, que quis mostrar a beleza de uma pessoa com deficiência. Eu brincava que era o 'Perninha' e as pessoas me admiravam pelo que eu fazia. Quero continuar com meus objetivos e metas. Meu pedido para esse ano é saúde, principalmente, e que isso se resolva. Que saia uma determinação o quanto antes, sim ou não, para que a gente possa continuar a sonhar. Não sei se caminho para frente ou para trás e já faz um ano disso", desabafa.
Para entender o imbróglio: as classes de 1 a 10, entre as 14 da natação paralímpica, são voltadas a deficientes físico-motores. André era da classe S (do inglês swimming) 10, de menor grau de comprometimento funcional. Ele teve poliomielite diagnosticada aos dois meses de vida, após reação à vacina, que deixou com sequela na perna esquerda, mesmo depois de oito anos em hospitais e sete cirurgias.
As reclassificações pelas quais o brasileiro passou há um ano em São Paulo - antes do Open Internacional, disputado no Centro de Treinamento Paralímpico - avaliaram que ele não era deficiente ‘o suficiente’ para se enquadrar na classe S10. Como não há categorias acima, André foi considerado inelegível após 15 anos de carreira, 14 pódios paralímpicos, 32 mundiais e 21 parapan-americanos. Na ocasião, segundo ele, a análise na piscina constatou uma mínima propulsão no tornozelo esquerdo – o que, até hoje, o nadador não digeriu.
"Enquanto uma pessoa que estudou fisioterapia por três anos e meio, não posso dizer 100% com propriedade, mas, posso achar e ter convicção de algumas coisas. O estudo do movimento, a cinesiologia, não mudou a ponto de a gente ter grandes modificações nesses 15 anos na classificação funcional. Acho que ela precisa ser mais transparente, para pessoas, atletas e técnicos entenderem um pouco mais. Imagina a cabeça de um indivíduo que vai para uma competição sem saber qual sua classe?", indaga.
(Texto: Lincoln Chaves. Foto: Cristina Índio/Agência Brasil)